1. |
Boom
05:04
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Lá ninguém nos deu piçada, ninguém nos foi buscar à estrada
Quanto mais à frente andámos mais andámos pra nada
Dizei, dizei pela terra inteira, ainda aqui estamos à espera
Somo filhos do boom, netos da madrugada
Companhia na ravina.
Quem apareceu na hora crítica
No fim do fim do fim do serão
Chupou a paz da flôr da índica
Rodou a vez à mão amiga
Gozar com o bardo da batida
Fazer a voz fazer a mímica
Quando enfim chegar o ramadão
Nós a cuidar da horta púbica
Ele a parir uma república
Lá ninguém nos deu piçada, ninguém nos foi buscar à estrada
Quanto mais à frente andámos mais andámos pra nada
Dizei, dizei pela terra inteira, ainda aqui estamos à espera
Somo filhos do boom, netos da madrugada
Passa o cantil, a fúria bíblica
Já corre acesa na vertigem
Do chão nasceu a puta dum clarão
E nós a rir na hora crítica
Negligenciámos a logística
O alcatrão já afunila
As estrelas quietas lá em cima
Verão da mais real recordação
Quando incendiámos a colina
Na mais perfeita companhia
Lá ninguém nos deu piçada, ninguém nos foi buscar à estrada
Quanto mais à frente andámos mais andámos pra nada
Dizei, dizei pela terra inteira, ainda aqui estamos à espera
Somo filhos do boom, netos da madrugada
Esta árvore não tem galhos e as raízes pouco afundam
O velho deu-nos mais trabalho pra manter a malta junta
Somos filhos do boom, netos da madrugada
O velho quer a pichadura e vai cortar na semanada
Renovei o céu da boca pra falar mais às alturas
Acabei numa corrida a começar da sepultura
Escovo bem a minha crina, espalho bem a serradura
E na box o velho aos gritos pra manter a pichadura
Somos mais de dez mil braços a limpar um pára-brisas
O velho a exigir pistáchio, é a melhor cor de camisa
Ninguém nos foi buscar à estrada que a viagem é mais pura
De vez em quando o velho encosta pra manter a pichadura
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2. |
Lacerda
03:57
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António Lacerda
Só via duas cores
O branco do fato
O preto das flores
Das minas, da guerra
Do rum, dos tambores
Estragou lá uma perna
Hoje dança com dores
Kizomba Cannabis
Faziam Lacerda
Abrir mais a íris
Mexer mais a perna
Já cego, já manco
António tarraxa
A esquecer-se das flores
Que abateu no Lubango
Tarraxa com dores
Os millenials, os queers
A paz a alegria
António q’ inveja
Da vida sadia
Fez fisioterapia
Fez psicologia
E as cores não voltavam
E a perna doía
As ordens caíam
Á noite e ao dia
Sargento mandava
António fazia
Lisboa parece
O Lubango é magia
Sargento mandava
António fazia
Tarraxa com dores
Dança António dança
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3. |
Largo
04:28
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Dóooooooooooooi
Dói, pôr-me agora a lembrar.
Dóooooooooooooooooi
Ter de ser eu a contar.
Eu sei que no retiro não havia wifi.
Mas amor eu te juro, eu juro, o incidente incendiou os jornais.
Foi mesmo triste e ainda agora eu choro.
Pelas razões que em breve vou apresentar.
Ele era novo inda nem tinha 33.
E num segundo mandou tudo pelo ar.
70000 panfletos a voar.
Foi no banco central
Na fachada lateral
Foi o bem contra o mal
E ganhou quem mais quis ganhar
Um tão fértil talento
Era um génio em tormento
Era só ter bom senso
E havia de se empregar
E é que ele tinha em casa alguém pra amar. A mulher os três filhos, um de biberão.
Dóooooooooooooi
Dói, pôr-me agora a lembrar.
Dóooooooooooooooooi
Ter de ser eu a contar.
Dói põr-me agora a lembrar.
Um ano já foi-se amor e custa-me ainda falar
Matou-se à bomba e nem seguia uma fé
Daquelas que costumam dizimar
Era tão novo e tava já a pôr-se em pé
Com um livro quase quase a publicar
Um livro assim chamado: meu ofício é largar
Foi no banco central
Na fachada lateral
Foi o bem contra o mal
E ganhou quem mais quis ganhar
No panfleto só tava
Uma estrofe macabra
Que em voz de manada
A ralé pôs-se a cantar
Beib anda ver essa escáfia a andar pra trás.
Toma lá um abraço. Um abraço apertado do precariado.
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4. |
Camarinhas
04:02
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Tão-te a cair camarinhas da saia
E o magenta do céu, apascenta o teu
Meigo modo de vir
Frescas as línguas dão sal á mágoa
Não nos cansa a maré, desde a planta dos pés
Sempre, sempre a subir
Nas veias já se entrelaçam discretas núpcias brilham molhadas
Casei na praia e ninguém suspeita
Do que há de vir.
Tão-me a cair mentiras da boca
Hão-de nascer verdades, tu com boa vontade
dás-me a tua vida toda
Deus assobia estranhas colcheias,
Apesar da cara larga e da minha tenda estreita
Sempre quis dançar a meias
Na areia já se entrelaçam discretas núpcias brilham molhadas
Vagas e vagas já se anunciava
Casei na praia e ninguém suspeita (bis)
Nem sequer tu, nem sequer eu
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5. |
Huela
05:24
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Fé no braseiro todos andam mas ninguém descalça
Os sapatinhos tão doidinhos pra dançar a salsa
As bocas cantam pra comer mas a nota é falsa
Os orfãozinhos trocam trocos por um pé de valsa.
por um pé de valsa
Quando aparece o poeta, enlouquece a discoteca
Sua porca sua a ver se mundo amolece
Mocachinos e gritinhos etiquetas na caneca
Vida boa, dez crianças a aprender no Bangladesh
Desce, desce, desce, o poeta desce, vai dar rima à catequese
E é na sua língua crua que matilha faz a tese.
faz a tese.
Vem ver o poeta sujo.
Vem ver o poeta sujo a brilhar à luz da huela.
Vem num cavalo com caruncho, o hábito faz a sela.
Companheiros do magusto, há castanhas na panela
Tragam paus e parafusos porque a penitência é bela.
Satanás está lá sempre a ungir
O palato a glote e a língua
Na fornalha os três à míngua a forjar e a refundir
O lodo camuflado pla frescura do capim
O choro emparedado em cinco andares, dó, ré, mi
O som mal ensaiado com princípio meio e fim
O orfão enganado esta canção é só pra mim
Vem ver o poeta sujo.
Vem ver o poeta sujo a brilhar à luz da huela.
Vem num cavalo com caruncho, o hábito faz a sela.
Companheiros do magusto, há castanhas na panela
Tragam paus e parafusos porque a penitência é bela.
Tu dizes que eu sou bruxo, eu conheço é bem a selva
Nela durmo comó bicho, vampirizo à noite as goelas
E elas cantam por feitiço, montam feiras nas capelas
Pra orar ao deus postiço, eu: poeta à luz da huela.
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6. |
Vou Considerar
04:42
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Bulo até ao osso
mas não vergo nem agacho
ao magnata que apertar eu falo grosso
Nó que não desata
não o laço à toa no pescoço
e nem ao lanche afio a faca a canibais
Mas se prometes pagar
Eu bem preciso
Vou Considerar
Medo da penúria
ai da fome eu morro de cagaço
a vida é dura
mas o pão sou eu que amasso
Querem gente nova pra cavar nas catacumbas faço
Covas tão fundas que hei-de dar com um riacho
Se prometes pagar
Eu bem preciso
Vou m'arregaçar
Já tenho um emprego eu cavo, eu sacho
a cova estreita que um dia há-de ser minha
Se eu largar a pá
chega outro e toma o meu lugar
eu vivo roto a esvaziar
covas do tamanho justo para me enterrar
Só continuo porque prometem pagar
Se prometes pagar
Eu bem preciso
Vou Continuar
Faço o mais que eu posso
eu até vergo até agacho eu sei
que hei-de aprender a ser alegre aqui em baixo
Já nem falo grosso
e pra encher o próprio tacho eu só
eu só não sei achar o oposto do que eu acho
Se prometes pagar
Vou considerar
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7. |
Oxalá
05:09
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Assumir-me parasita
O Universo o meu fartote
Fazer-me útil só à vida
e uma manhã ver-me velhote.
E na preguiça dum chaparro
À sombra a fabricar alma
A longa trança com que amarro
Oportunidade e calma.
E se a alma não fabrica
Ver os filhos na encosta
Os rapazes como a brisa
Arrepiam e confortam
E lembrar-me da colmeia viva
Em que a lei era rainha
E do ferrão dos meus irmãos
Que queriam mais e eu não tinha
De zumbir atarefado
A confirmar que o mel é escasso
E a origem da abundância
A desvendar-se a cada passo
De chorar dez dias dobrado
Passar dez noites em pé
E quando eu fiquei cansado
Nasceu-me outro bebé.
inda querem mais da cacimba
nem ao escuro a mãe engana
já nasceu na terra preta,
um bébé na caravana
já nasceu na terra preta,
um bébé na caravana
e a sineta dobra dlim dlim dlão dlão,
já molha a língua à mama
e eu ando à chuva à espera dos frutos que o chão dará
eu ando à chuva
e há um dilema é um mau dilema, a rachar-me o coração
d’eu ser metade problema e metade resolução
há salvação ou noá salvação
Vai morar na terra preta
um bébé da massa humana
quando a mãe e o pai souberem
onde pára a caravana
por enquanto o plano indé ir àndar,
filho é ir àndar, filho é ir àndar.
e nao quero ouvir-te a duvidar,
ó pai há salvação, ou noá salvação
eu ando à chuva à espera dos frutos que o chão dará
eu ando à chuva
é um dilema é um mau dilema, a rachar-me o coração
d’eu ser metade problema e metade resolução
há salvação ou noá salvação
nunca farta a companhia, bota adubo na manada
quando a gente se vir livre, há-de estar acompanhada
quando a gente se vir livre
no chão da mata só com as canções que a gente cantar
no meio das ruínas civilizações inda a murmurar
e as manivelas da estupidez a enferrujar
vai morar na terra preta um bébé da massa humana
quando a mãe e o pai souberem onde pára a caravana
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